O maior deles todos é mesmo grande... de uma grandeza generalizada, que faz dos outros, os pequenos, pequenas amostras da espécie... todo negro, com porte de gigante e comportamentos simpáticos e brincalhões, distraído da sua aparência assustadora, que mantém os estranhos à distância, cautelosos, cozidos à parede, só com a insistência das nossas palavras de confiança, esquecem aquele primeiro susto e, reconhecem então a sua aproximação carregada de simpatia e afabilidade !
Este portento tem dois apêndices, pequenos e fieis, que o adoram e que ele adora... não fossem os três companheiros de uma infância de aventuras e liberdade, à solta nos campos, dentro e fora da quinta, pois, embora o espaço seja grande, não resistem à descoberta do que está para lá dos muros, o outro mundo, com outros perigos, companheiros,... e outro tanto que só eles conhecem!
O gigante e os seus amigos, são um prazer para quem os vê; todos nos deliciamos, todos reconhecemos o lado improvável daqueles laços de amizade... mal sabem eles o quanto diferente nos parecem, ao nosso olhar criterioso, aquelas disparatadas desproporções.
Pandinha, todo sensível e peludinho, malhado de branco sobre um pêlo preto e sedoso, muito infantil, tem sentido nos últimos dias, no pêlo, a segregação e os maus tratos da parte do seu rabugento irmão... Formigo, descobriu o seu perfil de reguila, depois de lhe ter passado a roda de um automóvel por cima, em manifestação pós-traumática, digo eu , sarapintou o pêlo, também negro, de um branco aqui e outro ali, que lhe dão um arzinho de maduro e, daí em diante, partiu para outras tendências... fez-se refilão, e mesmo muito pouco cordial para com o irmão... dá-lhe para o ciúme e a possessividade e quer o Zappa todo só para ele! Será que não vê a enormidade do fiel amigo, a generosidade e paciência com que aceita a dupla? Não achará ele que é muito cão para um só minorca?... não entenderá que a partilha gera mais e mais brincadeira? Assim parece!!!
É que a história está ainda incompleta, falta outro improvável elemento... uma cadelinha, com cerca de 5 anos, muito ciosa de si e do seu espaço, com feitio de poucos amigos, recebe as visitas refilando até que a mandemos calar, pois para ela todos os que não são de dentro são de fora... ou seja, ou vivem no Monte, ou para ela são intrusos, por mais que nos visitem, por mais que apareçam... feitios...
A aparência da menina é a de uma esfregonazinha velha, pequenina, contraria esta descrição com uns arranques de boa disposição quando dá corridas furiosas de um lado para o outro, empurrada por uma qualquer energia, feita de saudade curada na alegria de nos rever quando voltamos da rua, mas logo se aquieta voltando à sua habitual postura de solitária e sonhadora rapariga casadoira, a quem só aparecem noivos, mais uma vez, improváveis.
O seu nome, improvável também: Xakira!
É aqui que bate o ponto... ou seja a "nódoa", o motivo destes novos atritos, tem um enquadramento e na moldura do Formigo está estacionada a Xaquirinha, bela, cheirosa e sedutora coberta do seu manto de pêlo de esfregona usada, com feias marcas de olheiras feitas de despenteado pêlo acastanhado sobre um fundo branco sujo, muito sujo, malha aqui, malha acoli, tudo muito desordenado e irregular... a minha Xaquirinha é mesmo feiosa... mas ela não sabe... e não sou eu que lho vou dizer!
E lá andam todos, no seu grande espaço, despreocupados e bem cuidados pelo dono e mimados pela dona, empurrados por impulsos e instintos vão gozando os dias na descontracção que Deus lhes deu. Não me sinto DONA de coisa nenhuma mas nisto dos cães é assim que me vejo, pois eu sou tanto dona deles como eles donos do meu amor e ternura por eles, cada um na sua vidinha cada um no seu espaço!
O Zappa, grande em tamanho e simpatia, ai de nós quando lhe cheirar a namoros, acaba-se de vez com as amizades improváveis... o Pandinha, encolhido e surpreso com a nova agressividade do irmão, até há data tão igual, tão irmão, o Formigo menos irmão e mais macho, mais fera mais instinto, apesar do seu diminuto porte, sempre vai mostrando os caninos afiados a alguém... o inconformado sangue do mesmo sangue... e finalmente a donzela, a Xaquirita, entre o indiferente e o pomposo, de juventude duvidosa, sempre vai aproveitando os admiradores, alguma cor e animação hão-de trazer à sua pacata existência...
E nós, os racionais cá nos vamos divertindo com estas nuances do relacionamento canino, tão mais legítimo e compreensível do que, bom enfim... era do fiel amigo dos homens que tratava a minha vontade de escrever... não tencionava bater em ninguém a esta hora.